sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Francisco enfrenta a homofobia do Vaticano

Padre que declarou-se gay acusa o clero de ser “violentamente homofóbico”.
Por Marco Lacerda*
No voo de volta do Rio de Janeiro para Roma (28/7/2013), o Papa Francisco – diante de uma pergunta da repórter brasileira Ilze Scamparini, correspondente da Globo na Itália - falou aos jornalistas sobre a homossexualidade, citando explicitamente o Catecismo da Igreja, doutrina oficial do Magistério da mesma. Entre outras coisas disse: "Se uma pessoa é gay e procura Jesus, e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la? O Catecismo diz que não se deve marginalizar essas pessoas por isso. Elas devem ser integradas à sociedade. O problema não é ter esta tendência. Devemos ser irmãos.” 
Ao dizer isso, Francisco iluminou os muitos séculos de obscurantismo em que a Igreja Católica tem vivido através dos tempos. Pelo visto, a maioria dos seus súditos não se deixou tocar por esse sopro de luz. Esta semana Krysztof Charamsa, o padre que declarou publicamente que é gay e tem um namorado, atacou duramente a hierarquia da Igreja Católica. Em carta enviada ao papa Francisco, ele acusa o Vaticano de transformar num “inferno” a vida de milhões de católicos homossexuais do mundo todo. Charamsa, que foi afastado de suas funções após o anúncio, também critica o clero por “perseguir” e provocar “sofrimento incomensurável” aos católicos gays e suas famílias.
Polonês de 43 anos, o prelado afirma que o clero católico está cheio de “homossexuais” mas que também é “violentamente homofóbico”, segundo a BBC, que teve acesso à carta. Nela, o padre pede a “todos os cardeais, sacerdotes e bispos gays” que tenham “a coragem de abandonar esta Igreja insensível, injusta e brutal”.
Hierarquia da Igreja transforma a vida dos católicos gays em ‘um inferno’
Charamsa, que era oficial da Congregação para a Doutrina da Fé (o antigo Tribunal do Santo Ofício) e secretário-adjunto da Comissão Teológica Internacional do Vaticano, escreveu a carta há algumas semanas – no mesmo dia em que apareceu em público em Roma para falar de sua homossexualidade e apresentar seu namorado. Na carta, explica ao papa os motivos da declaração e diz que, após “um período longo e atormentado de oração e discernimento”, tomou a decisão de “rejeitar publicamente a violência da Igreja contra os homossexuais, lésbicas, bissexuais e transexuais”.
O polonês agradece o papa Francisco por alguns de seus gestos e palavras sobre os homossexuais. De fato, Francisco será lembrado para sempre pela frase dita a bordo do avião que o levou de volta a Roma depois da visita ao Brasil: “Quem sou eu para julgar os gays?”, disse o Sumo Pontífice. Ao mesmo tempo, contudo, o padre Krysztof Charamsa indica que esses gestos de nada adiantarão se não forem retiradas todas as declarações ofensivas da Santa Sé contra os homossexuais.
O anúncio de Charamsa, sacerdote desde 2003, desatou uma fortíssima polêmica no Vaticano. Sua declaração pública foi feita exatamente na véspera da reunião de 270 padres sinodais – bispos, cardeais, religiosos e especialistas – para tratar dos novos modelos de família. 

Krysztof Charamsa afirmou que a Congregação para a Doutrina da Fé do Vaticano - o departamento encarregado de manter a doutrina católica do qual ele faz parte – pratica "sabotagem" contra o papa e as reformas propostas por ele.
"A Congregação para a Doutrina da Fé do Vaticano está em guerra contra Francisco. Não é apenas um órgão homofóbico, é também ‘Francisco-fóbico’. Eles ficam o tempo todo agindo contra o papa. É uma sabotagem contra o meu chefe espiritual”, afirmou Charamsa.
*Marco Lacerda é jornalista, escritor e Editor Especial do DomTotal.

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