sábado, 20 de fevereiro de 2016

Fósforo, a próxima guerra

O mundo está prestes a viver uma crise de proporções que podem levar a guerras.
Por Fábio José Gomes*
Nos últimos séculos, especialmente após a revolução industrial, os recursos naturais do planeta sofreram intensa exploração pelo homem. Isso se deve ao aumento explosivo da população humana e à mudança de seus hábitos. Hoje a população mundial passa de sete bilhões de indivíduos, com estimativa para 2100 de onze bilhões, de acordo com o artigo publicado na revista Science, “World population stabilization unlikely this century”, sendo que essa população consome milhares de toneladas de alimentos e outros recursos diariamente.
Para suprir a crescente demanda mundial por alimentos, a produção agrícola de vários países entrou na fase da agroindustrialização, deixando para trás o padrão extensivo tradicional e assumindo um padrão intensivo, no qual a produtividade tornou-se a principal fonte de lucratividade.
Surge assim uma agricultura mecanizada onde as características físicas do solo são mais importantes que as químicas, ou seja, o solo deve funcionar como um bom suporte para as plantas, capaz de sustentar as lavouras e ainda tornar possível a mecanização, sendo, até certo ponto, dispensável uma boa fertilidade natural.
Um bom exemplo dessa situação é a agricultura de larga escala que é praticada no cerrado brasileiro, um dos principais celeiros agrícolas do mundo, mas que só produz com a implementação da adubação e da correção da acidez. Em um artigo publicado em 2012 o renomado pesquisador brasileiro Alfredo Scheid Lopes e colaboradores, estes afirmam que nos solos do Brasil predominam graves limitações para a produção agrícola em termos de baixa fertilidade natural, sendo ainda, ácidos e pobres em nitrogênio disponível (N), fósforo (P), potássio (K), de cálcio (Ca), magnésio (Mg), enxofre (S), boro (B), cobre (Cu), molibdénio (Mo) e zinco (Zn).

Nutrientes como fósforo são necessários para o crescimento e produção das plantas
Nesse caso, quando o solo não disponibiliza naturalmente os nutrientes em quantidades adequadas, há a possibilidade de elevada produtividade somente com o suprimento dos nutrientes deficitários através de adubação. Nutrientes como fósforo, nitrogênio e potássio são necessários para o crescimento e produção das plantas. O nitrogênio pode ser obtido por meio de fixação biológica ou processos industriais, mas outros nutrientes, como por exemplo, o fósforo é obtido em grande parte através da mineração ou em menor quantidade por reciclagem.
A demanda por fertilizantes no cenário internacional é crescente, em especial pelos fosfatados. A maior procura e a oferta limitada causou um aumento no custo do fosfato de rocha. Em 1961 a tonelada custava cerca de 80 dólares saltando para até 450 dólares em 2008, o preço deste insumo, desde então, têm flutuado, mas agora está em cerca de 700 dólares a tonelada, segundo relatório de 2015 do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA).
O mundo é altamente dependente do fósforo como nutriente para produção de alimentos, no entanto, estima-se que a maior mina de fósforo dos EUA estará esgotada em 20 anos e um balanço da vida útil das reservas que podem suprir à agroindústria e à população humana estão limitadas a cerca de 60 a 250 anos. Assim, o equilíbrio geopolítico do poder pode ficar abalado quando nações e corporações começarem a competir pelas reservas remanescentes em lugares como Marrocos.

A escassez das reservas de fósforo provocará redução na produtividade agrícola
A FAO – órgão das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação acendeu a luz vermelha em fevereiro de 2011 alertando que oitenta países se encontravam em situação de insegurança alimentar. Essa situação pode se agravar, e muito, com a escassez das reservas de fósforo, quando haverá considerável redução na produtividade agrícola em decorrência da falta desse nutriente (vide Lei do Mínimo), principalmente em lavouras de solos tropicais que tem baixas concentrações de fósforo disponível e no decorrer dos ciclos de culturas pode acabar se esgotando.
Surge então uma equação nada fácil de resolver, em que se percebe um cenário global que projeta uma crise de oferta de fósforo, e consequentemente de alimentos, em um futuro não muito distante, podendo culminar em conflitos entre nações pelo domínio das ultimas reservas ou por solos com capacidade produtiva de alimentos.
Será que esse é o destino da humanidade? Padecer por falta de alimento, recorrer a mecanismos como a guerra para garantir a sobrevivência? De acordo com os relatos na literatura existem meios para evitar mais essa tragédia humana. A solução irá exigir um esforço proporcional à magnitude do problema, por exemplo, estudos realizados no Departamento de Ciência do Solo da Universidade Federal de Lavras (DCS/UFLA) procuram uma alternativa para minimizar a necessidade de altas doses de aplicação de fósforo com o uso de bactérias solubilizadoras desse nutriente, enquanto um outro, publicado na revista Nature em 2015, pelo cientista do solo Ronald
Amundson e colaboradores, sinaliza que a diminuição das taxas de perda de nutrientes do solo pela erosão hídrica e a reciclagem dos nutrientes são saídas a considerar. Segundo esses autores deve haver parcerias para desenvolver métodos eficientes de reciclagem de nutrientes e sistemas de redistribuição em ambientes urbanos.
Nessa realidade onde a reciclagem é indicada para suprir os nutrientes do solo é aconselhável incentivar o aproveitamento dos resíduos compostáveis e a produção e consumo local de alimentos, uma vez que diminui a demanda por alimentos produzidos pela agroindústria que fatalmente continuará consumindo os fertilizantes das fontes em esgotamento. A reciclagem do fósforo pode ser tomada como a principal saída para contornar a escassez das reservas desse nutriente e evitar uma grande guerra mundial motivada pela disputa por este recurso.
Oito alimentos ricos em fósforo:
*Fábio José Gomes, Engenheiro Florestal pela Universidade Federal de Lavras e mestrado em Ciência do Solo com ênfase em Recursos Ambientais e Uso da Terra pela UFLA, em artigo publicado por EcoDebate.

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