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A população fala em fim do mundo. que mundo? O mundo girou, girou e nada mudou.
Bush teria explodido até um milhão e duzentos mil inocentes iraquianos.
Por Luís Giffoni*
No terceiro milênio AC, os habitantes da Mesopotâmia estavam à beira de um ataque de nervos, provocado por exércitos invasores. Julgavam viver o fim do mundo. O rei de Uruk, em tese protetor de sua gente, arrebanhava todas as virgens nascidas em suas terras e dormia com elas antes dos maridos. Os assírios perenizaram em relevos a exibição, diante de seus imperadores, de cabeças de inimigos cortadas. Os egípcios, idem. Mais tarde, os judeus se vangloriaram de passar a fio de espada cidades inteiras.
Um exemplo milenar de valentia, até hoje venerado, foi deixado por Leônidas, o espartano, com seus 300 condenados à morte pelos persas. Os romanos matavam e depois impunham a Pax Romana: ai dos vencidos! Os bárbaros não os pouparam quando a Cidade Eterna ficou não tão eterna assim. Na Idade Média, um imperador de Constantinopla devolveu para a Bulgária todo um exército com os olhos vazados, exceto um dos soldados, que serviu de guia para o retorno. A revolta de An Lushuan ceifou ao redor de 35 milhões de chineses. Número semelhante ao dos mortos durante as invasões mongóis. Os cruzados comeram a carne assada de muçulmanos. Os muçulmanos tampouco pouparam os cruzados. No século 14, vândalos percorriam a Europa saqueando e matando a esmo. A população acreditou, de novo, no fim do mundo.
As guerras religiosas dos séculos 16 e 17 ceifaram milhões de vidas. São Bartolomeu que o diga. Nas Américas, os Conquistadores trucidaram até talvez 35 milhões de índios. Nós, brasileiros, deixamos o Paraguai sem homens, depois que literalmente os dizimamos no século 19. Um rei carola da Bélgica trucidou mais de um milhão de congoleses para implantar sua colônia na África. Número semelhante ao de armênios liquidados pelos turcos.
Faz exatamente 100 anos a batalha do Somme, a mais terrível da Primeira Guerra, deglutiu um milhão de soldados. No fim da Segunda Guerra, que contabilizou cinquenta milhões de vítimas, para punir os alemães, norte-americanos e ingleses incendiaram mais de 100.000 civis em Dresden. O fogo também sobrou para os japoneses em Hiroshima e Nagasaki. Seis milhões de judeus pereceram sob a insanidade de Hitler e do Terceiro Reich. Na Rússia, os caídos passaram dos vinte milhões.
Os vietnamitas dizem que 10 milhões de seus compatriotas tombaram ante as armas dos norte-americanos. Aquela garotinha queimada pelo napalm até hoje grita de dor e pavor nos meus ouvidos. O conflito entre hutus e tutsis, em Uganda, massacrou quase um milhão em três meses. Pol Pot exterminou dois milhões de cambojanos.
George W. Bush teria explodido até um milhão e duzentos mil inocentes iraquianos que nada tinham a ver com as Torres Gêmeas ou o Onze de Setembro. E legou o caos à região. A Síria já perdeu 500.000 pessoas na briga de superpotências, ditadura e religião em seu território. No terceiro milênio DC, a Mesopotâmia vive o mesmo desespero de três milênios AC. A população fala em fim do mundo. Que mundo? O mundo girou, girou e nada mudou. O morticínio continua.
Nos últimos anos, os ataques terroristas têm nos deixado em revolta e sobressalto, com as barbas de molho. Argentina, Inglaterra, Espanha, Estados Unidos, França, Turquia, Iraque, Afeganistão, Arábia Saudita, a lista de países e vítimas parece não ter fim. A barbárie ronda o planeta. Sempre rondou. Apesar de todo o orgulho pela civilização, o ser humano não hesita em eliminar o semelhante, sob qualquer pretexto. Civilização se escreve com sangue?
*Luís Giffoni tem 25 livros publicados. Recebeu diversas premiações como do Prêmio Jabuti de Romance, da APCA - Associação Paulista de Críticos de Arte, Prêmio Minas de Cultura, Prêmio Nacional de Romance Cidade de Belo Horizonte.
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