terça-feira, 29 de novembro de 2016

Garantia dos direitos autorais em tempos de pirataria

A proteção legal é ampla, conforme rol exemplificativo do artigo 7º da Lei 9.610/98.
Prejuízo das principais indústrias com a pirataria chega a bilhões. Além disso, é crime.
Prejuízo das principais indústrias com a pirataria chega a bilhões. Além disso, é crime. (Reprodução)

Por Renato Campos Andrade*

O fim de novembro e início de dezembro anunciam a chegada de diversas festividades para celebrar o Natal e Ano Novo. Muitas dessas festas são animadas por músicas de artistas que não fazem parte da celebração, mas que, em virtude do seu trabalho intelectual, devem receber os direitos autorais. Nem sempre isto é respeitado.

A Lei 9.610, de 1998, juntamente com a Constituição e o Código Civil, dispõe sobre a proteção dos direitos autorais. A proteção é ampla, conforme rol exemplificativo do artigo 7º da Lei 9.610/98:

Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como:

I - os textos de obras literárias, artísticas ou científicas;

II - as conferências, alocuções, sermões e outras obras da mesma natureza;

III - as obras dramáticas e dramático-musicais;

IV - as obras coreográficas e pantomímicas, cuja execução cênica se fixe por escrito ou por outra qualquer forma;

V - as composições musicais, tenham ou não letra;

VI - as obras audiovisuais, sonorizadas ou não, inclusive as cinematográficas;

VII - as obras fotográficas e as produzidas por qualquer processo análogo ao da fotografia;

VIII - as obras de desenho, pintura, gravura, escultura, litografia e arte cinética;

IX - as ilustrações, cartas geográficas e outras obras da mesma natureza;

X - os projetos, esboços e obras plásticas concernentes à geografia, engenharia, topografia, arquitetura, paisagismo, cenografia e ciência;

XI - as adaptações, traduções e outras transformações de obras originais, apresentadas como criação intelectual nova;

XII - os programas de computador;

XIII - as coletâneas ou compilações, antologias, enciclopédias, dicionários, bases de dados e outras obras, que, por sua seleção, organização ou disposição de seu conteúdo, constituam uma criação intelectual.

Para não deixar dúvidas, a lei indica expressamente que “a proteção aos direitos de que trata esta lei independe de registro” e pertencem ao autor “os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que criou”. Os direitos morais seriam, por exemplo, direito de reivindicar a autoria da obra, conservar a obra inédita, o de retirar de circulação a obra ou de suspender qualquer forma de utilização já autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem afronta à sua reputação e imagem, entre outros.

Já no que tange aos direitos materiais, trata-se do direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da sua obra literária.

Importante descrever as hipóteses legais que não se traduzem em ofensa aos direitos autorais como a reprodução: na imprensa diária ou periódica, de notícia ou de artigo informativo, publicado em diários ou periódicos, com a menção do nome do autor, se assinados, e da publicação de onde foram transcritos; em diários ou periódicos, de discursos pronunciados em reuniões públicas de qualquer natureza; de retratos ou de outra forma de representação da imagem, feitos sob encomenda, quando realizada pelo proprietário do objeto encomendado, não havendo a oposição da pessoa neles representada ou de seus herdeiros; de obras literárias, artísticas ou científicas, para uso exclusivo de deficientes visuais, sempre que a reprodução, sem fins comerciais, seja feita mediante o sistema Braille ou outro procedimento em qualquer suporte para esses destinatários, entre outros.

Destaque para a possibilidade de reprodução, em um só exemplar de pequenos trechos, para uso privado do copista, desde que feita por este, sem intuito de lucro. Aqui se encontram a maioria das cópias extraídas por estudantes. Por fim, salienta-se que a lei indica que paráfrases e paródias sobre as obras são livres, desde que não denigram a obram bem como pode-se representar, por meio de pinturas e fotografias, obras situadas em locais públicos.

A questão é abordada no artigo A propriedade intelectual no Brasil, pelo advogado, professor, membro da Comissão de Direito Empresarial da 34ª Subseção da OAB/MG – Itaúna/MG, mestre em Direito Empresarial, mestre em Direito Internacional e Comunitário, especialista em Direito Processual Civil e em Coordenação Pedagógica, Leonardo Ferreira Vilaça. Ele afirma que “o ato criativo como fruto do intelecto humano é, portanto, um bem passível de proteção jurídica que, nesse caso, caracterizaria um direito subjetivo de seu criador”.

De acordo com ele, direito autoral é, na verdade, uma conjunção de prerrogativas conferidas por lei a uma pessoa (natural ou jurídica) criadora de um produto/bem intelectual específico, para que ela possa fruir, usar e gozar dos benefícios patrimoniais e morais advindos da exploração de suas criações, para que honre socialmente seus deveres e obrigações inerentes. Além do direito de propriedade presente na Carta Magna de 1988, que garante ao criador a propriedade sobre seu bem intelectual produzido, o direito autoral está hoje regulado pela Lei 9610/1998 (Lei de Direito Autoral - LDA).

Mas como é feito o recolhimento dos valores devidos aos artistas quando há reprodução de suas obras? Esta resposta está no artigo A efetividade dos direitos autorais passa pelo Ecad, do advogado, especialista em Direito da Empresa, pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho, e assessor jurídico das Centrais de Abastecimento de Minas Gerais CeasaMinas, Ricardo Ferreira do Prado Cardoso e Silva. Ele lembra que a Lei 5.988/73, posteriormente revogada pela Lei 9.610/98, criou o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad).

De acordo com ele, o Ecad é uma instituição de direito privado, sem finalidade lucrativa, cujo principal objetivo é unificar a arrecadação e a distribuição dos direitos autorais de execução pública musical, administrada e controlada em forma de gestão coletiva, por sete associações, motivo pelo qual a afiliação a ela, necessariamente, passa por uma dessas associações.

A dúvida se dá em relação a quando será devido o repasse ao órgão em virtude da execução da obra, especialmente as musicais. Ricardo Ferreira do Prado Cardoso e Silva esclarece a respeito da Unidade de Direito Autoral (UDA), como calcular e quando é devida:

Em linhas gerais, a cobrança da unidade de direito autoral – UDA, entretanto, leva em consideração a classificação do usuário como Permanentes ou Eventuais na frequência de utilização da música, e o tipo de atividade, isto é, Usuários Gerais, como academias, clínicas, bares, boates, entre outros, show e eventos, rádio e televisão, serviços digitais e cinema.

A importância do órgão e sua efetividade é celebrada pelo especialista, ao indicar que se sua atuação se trata de verdadeiro sucesso, em virtude de ter distribuído no ano de 2015 R$ 771,7 milhões a 155.399 titulares de música (compositores, intérpretes, músicos, editores e produtores fonográficos) e associações.

No entanto, o ECAD e os artistas lutam diariamente contra a crescente pirataria. Estudo realizado pela consultoria Tru Optic,  em fevereiro de 2015, colocou o Brasil no segundo lugar no ranking global de pirataria, atrás apenas dos Estados Unidos. O ato que se tornou famoso com a cópia de cds e dvds, alastrou-se exponencialmente com downloads (cópias baixadas da internet) ilegais. Registrou–se no ano citado 1,16 bilhão de downloads ilegais, com ações originadas a partir de 71,2 milhões de endereços IP.

O prejuízo das principais indústrias com a pirataria chega a centenas de bilhões de dólares. Além disso, tais atos são crimes! O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se manifestou no sentido de que “presentes a materialidade e a autoria, afigura-se típica, em relação ao crime previsto no artigo 184 (violar direitos de autor e os que lhe são conexos), parágrafo 2º, do CP, a conduta de expor à venda CDs e DVDs piratas”. A pena aplicada vai de 3 meses a 4 anos, e pode incluir multa.

As consequências legais desses atos são bem descritas pela advogada Daniela Martins Muritiba. No artigo A pirataria e sua relação com o Direito Pena, ela destaca que o sujeito ativo (aquele que exerce a conduta criminosa) é quem atenta contra os direitos do autor, “por qualquer forma possível”, como reprodução clandestina e comercialização de produtos. Mas indica a ressalva da lei que prescreve que “copiar obra integral, em um só exemplar, para uso exclusivamente privado, sem intuito de lucro, não é considerado crime.”

Sobre os já citados downloads, a advogada destaca que “se tais arquivos foram disponibilizados na internet sem o consentimento do autor da obra, aqueles que disponibilizaram a obra, bem como aqueles que a copiaram estão sujeitos as penas previstas no artigo 184 do Código Penal.”

Sugestão de pauta

A Super Manchete de Direito é uma publicação semanal do portal Dom Total, em parceria com a Dom Helder Escola de Direito, com a colaboração de profissionais e especialistas nos temas abordados. Envie-nos sugestões de assuntos que você gostaria de ver nesta editoria, pelo e-mail noticia@domtotal.com, escrevendo 'Manchete de Direito' no título da mensagem. Participe!

*Renato Campos Andrade é advogado, professor de Direito Civil e Processo Civil da Dom Helder Escola de Direito, mestre em Direito Ambiental e Sustentabilidade, especialista em Direito Processual e em Direito do Consumidor.

EMGE
*O DomTotal é mantido pela Escola de Engenharia de Minas Gerais (EMGE). Engenharia Civil conceito máximo no MEC. Saiba mais!

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