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Orar sem cessar é uma das interpelações que o Mestre faz a seus seguidores.
A narrativa da oração no Getsêmani ilustra sua comunhão com o Pai. (lumoproject.com)
Por Felipe Magalhães Francisco*
Uma das questões ligadas à pessoa de Jesus, a respeito da qual as pesquisas teológicas não levantam dúvidas, é sobre a intensa vida de oração do Mestre da Galileia. Jesus foi um homem que dedicou muitos momentos de sua história à oração. Essa era fonte de sua consciência do seu ser Filho, pois era por meio da prática oracional que fazia, de modo profundo, a experiência de Deus como Pai e, em decorrência disso, crescia na compreensão do significado de sua missão.
O hábito oracional de Jesus, sem dúvidas, foi bastante influenciado por sua formação religiosa como judeu. Contudo, o modo como os Evangelhos retratam a relação de Jesus com os contínuos e recorrentes momentos de oração, revela que há uma singularidade de Jesus, em sua vida espiritual: por meio da oração, ele nutria uma profunda comunhão com o Deus que ele reconhecia como Pai e, a partir disso, pôde discernir sua missão, de anunciador e inaugurador do Reino de Deus. A narrativa da oração no Getsêmani ilustra bem isso.
O que Jesus vive no seu cotidiano, insiste para que os seus discípulos também assumam nas próprias vidas: orar sem cessar é uma das interpelações que o Mestre faz a seus seguidores e seguidoras. Estes, por sua vez, parecem – segundo o que a narrativa nos leva a crer – que percebiam a importância de que o Mestre, ele mesmo, os ensinasse como rezar. E a mesma experiência que Jesus fazia com Deus, ele ensina aos seus discípulos: chamar Deus de Pai e se comprometer com as consequências disso, na acolhida do Reino.
Orar não é, certamente, uma prática própria de cristãos e cristãs. É, mais que isso, uma prática que faz parte da própria experiência humana. A singularidade cristã está no acento que se dá à perspectiva da comunhão com Deus, na consciência de uma atitude filial, da parte de quem orienta o seu coração para o Pai. Tudo isso é bastante integrador e é a respeito disso que os artigos de nossa matéria especial tratam.
No primeiro artigo, Oração: movimento santificador da existência, Luciana Cangussu propõe uma instigante reflexão, a partir da abordagem da Psicologia Transpessoal. Partindo da exortação de Jesus aos discípulos para que, quando fossem orar, dirigissem ao reservado do próprio quarto, ao contrário do que faziam os hipócritas que queriam ser vistos, a autora estabelece um paralelo com o movimento de interiorização, no qual da dimensão física, passa-se à dimensão emocional e, em seguida, à dimensão espiritual, o âmago de nossa essência. Esse é, sem dúvida, um movimento santificador, ao qual cada pessoa é convidada.
O ser humano é capaz de acessar, no mais profundo de si e no encontro com os outros, o coração de Deus. Tal capacidade nos é garantida, definitivamente, pela pessoa de Jesus Cristo, o Filho de Deus, que assumiu nossa humanidade. Esse é o pano de fundo do segundo artigo, A experiência de amizade com Deus na oração, de Sandra Sousa. A oração é um caminho de intimidade com Deus, que se faz num processo de intensa experiência com o amor, que configura o ser mesmo de Deus.
Refletindo acerca da importante dimensão ética da oração, temos o artigo Pai-Nosso, a oração dos cristãos, de Rodrigo Ferreira da Costa. A oração ensinada por Jesus e repetida continuamente pelos cristãos e cristãs pressupõe um comprometimento existencial de todos os batizados e batizadas, que estão sacramentalmente associados à vida e missão de Jesus e, em consequência disso, à sua causa: o Reino de Deus. Nesse sentido, o Pai Nosso, como modelo para toda a oração cristã, é convite a que façamos, na vida, aquilo que rezamos, no interior de nosso coração.
Boa leitura!
*Felipe Magalhães Francisco é teólogo. Articula a Editoria de Religião deste portal. É autor do livro de poemas Imprevisto (Penalux, 2015). E-mail: felipe.mfrancisco.teologia@gmail.com.
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