quinta-feira, 3 de setembro de 2015

A mineração e os povos indígenas colombianos

A região amazônica possui cerca de 140 títulos de mineração vigentes, a maioria dedicada ao ouro.

Colômbia ainda abriga tribos pacíficas ante a exploração do garimpo.
Por Ana Virgínia Gabrich*
Tema amplamente discutido, a mineração em terras amazônicas ocupa frequentemente o centro de debates envolvendo economia e meio ambiente. Entretanto, poucas são as vezes em que o problema é analisado sob a ótica dos habitantes da Floresta ou, mais especificamente, sob a ótica das comunidades indígenas que ocupam áreas de mineração na Floresta Amazônica.
Com o intuito de dar voz àqueles diretamente afetados pelo problema, em 2012 pesquisadores locais pertencentes às comunidades indígenas dos departamentos colombianos do Amazonas, Putumayo, Vaupés, Caquetá e Casanare entrevistaram doze habitantes de diversas comunidades indígenas localizadas nesses departamentos que, por meio de testemunhos anônimos, apresentaram um pouco de sua cultura. Os testemunhos fazem parte do documento intitulado “contribuições locais a uma história da mineração na Amazônia Colombiana”.
A mineração na Amazônia Colombiana está avançando em larga escala. De acordo com informações recentes divulgadas pelo SIMCO (Sistema de Información Minero Colombiano), consta do “cadastro e registro minerário” que a região amazônica possui cerca de 140 títulos de mineração vigentes, o que abrange uma área aproximada de 100.000 hectares, em sua grande parte dedicada à exploração de ouro.
O que poucos sabem é que o ouro, além de sua importância econômica, exerce um papel místico para os povos indígenas. Assim, para as comunidades indígenas da Amazônia Colombiana, o ouro é visto de uma maneira xamânica. Segundo a tradição indígena, o ouro e demais minerais têm sua origem no sol, na lua e nas estrelas, ou seja, são uma espécie de “pegadas” que demonstram a relação dos astros com a terra. Para os indígenas o mundo, em sua origem, era habitado por espíritos sagrados, que tinham a missão de harmonizar a convivência entre os homens e a natureza. Dessa maneira, o ouro tem funções específicas, como a de curar doenças, o que faz com que o local onde é encontrado seja considerado um local sagrado.
Ainda de acordo com essa visão xamânica, toda a sabedoria indígena deve ser utilizada em prol da comunidade. Com isso, existe uma tradição que deve ser respeitada e cumprida por todos os xamãs, de todas as etnias. Segundo essa tradição, os xamãs devem trabalhar para manter o equilíbrio da energia natural da comunidade durante todo o ano, fazendo previsões sobre o futuro de suas comunidades, evitando que problemas naturais – como deslizamentos de terra ou invernos/verões muito prolongados – possam prejudicar a vida de seus habitantes. Entretanto, quando há alguma interferência externa em determinada área, essa área perde a sua energia natural, o que gera desequilíbrio e impossibilita que os xamãs tenham visões claras e protejam suas comunidades.
Além disso, para os indígenas os rios também são fonte de energia e qualquer tipo de dano em suas águas interfere nessa energia e, consequentemente, interfere no conhecimento e no equilíbrio da natureza.
Outra questão decorrente da mineração é que, por ser uma fonte de renda, muitos indígenas acabam trabalhando com a atividade minerária, deixando de lado suas crenças e sua cultura, em busca de ganhos econômicos. Tal cenário revela a vulnerabilidade dos povos indígenas da Amazônia colombiana e a necessidade de se estabelecer um limite entre o desenvolvimento econômico e a preservação dos aspectos culturais.
As palavras de um habitante de uma comunidade indígena da Amazônia Colombiana expressam bem a importância que a natureza exerce para esses povos e como a exploração da Floresta influencia em suas crenças: “quando se retira uma riqueza do nosso mundo e se desocupa um lugar, tal lugar fica como uma pessoa inconsciente, que não sabe o que fazer; fica louco e pode voltar-se contra a sua própria família ou tribo. O lugar vazio, sem energia, perde o equilíbrio”.
*Ana Virgínia Gabrich é mestre em Direito Ambiental pela Escola Superior Dom Helder Câmara e integrante do Grupo de Pesquisa Estratégica sobre a Pan-Amazônia

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